Difícil mandamento esse imposto por Deus: não cobiçar a mulher do próximo.
Me parece mais um mandamento humano, demasiado humano — brotado da mente de um homem que não se garante, e que trata a mulher como um objeto que ele teme perder.
No Diário de um Sedutor, Kierkegaard relata que, desde os primórdios, as mulheres fazem a cagada de cometer idiotices como entrar em um relacionamento, se comprometer com o primeiro que aparece e, no final, nem saber o que ganharam nem o que perderam.
Isso é culpa dos homens, que caçam as melhores mesmo sabendo do seu baixo valor para se autoafirmarem — mas principalmente, culpa das próprias mulheres.
Isso é fácil de observar.
As mulheres têm uma tendência a não lidarem consigo mesmas, com o tédio, e a terceirizarem a diversão de suas vidas — até mesmo o prazer.
Isso revela uma insegurança profunda: sobre o próprio corpo, sobre a sexualidade, e sobre como funciona o seu desejo.
Muitas mulheres transam muito menos que os homens e com menos parceiros, mas é certo que poucas chegaram ao orgasmo. Isso se deve, em parte, aos parceiros que não entendem — e nem se importam — com o desejo das suas companheiras.
Mas a culpa maior é delas mesmas: por escolherem esses parceiros e por não conhecerem sua própria sexualidade.
Sexo não é instinto.
Sexo se aprende, se compreende, se melhora com aprendizado e prática. É igual correr: todos sabem correr, mas nem todos usam a técnica correta ou alcançam os melhores resultados.
Assim como a escrita, a arte, a cultura: tudo isso é aprendizado — o orgasmo, a técnica, o prazer também o são.
E eu não me preocupo só com a minha sexualidade. Como um homem cis, estudo principalmente a sexualidade das mulheres.
Mas a concorrência pela mulher do próximo e o ego inflado dos homens fazem com que nenhum deles admita que não entende de sexo — porque “pega mal”. Sentem constrangimento.
Isso só gera um monte de homem medíocre… e mulheres que não conseguem gozar.
É por isso que, quando analiso os pares das mulheres que conheço, por mais bonita que ela seja, eu não sinto inveja.
Pelo contrário: sinto pena.
Pena da mulher que agiu como a personagem de Kierkegaard, e agora se vê com um homem desses. Está fadada à infelicidade. Ao não-orgasmo.
Mas, repito: a sexualidade e a felicidade da mulher exigem estoicismo. Ela não deve focar no outro — mas sim em si mesma, nos aspectos que pode controlar.
Anatomicamente, a mulher tem uma Ferrari nas mãos — mas não sabe usar.
Seu corpo é muito mais apropriado ao prazer do que o dos homens. O clitóris tem terminações nervosas muito mais refinadas que o pênis.
Muitas mulheres não gozam porque não gostam da penetração. O orgasmo delas não está na vulva — está no clitóris.
Mas os homens só querem “meter”. Só veem o clitóris, sem conhecer sua sensibilidade. Metem a língua dura porque viram no pornô.
A pornografia é um mal: mostra mulheres gemendo em poses teatrais, como se o prazer delas viesse de um vai-e-vem violento, quando, na verdade, ele vem do flexionamento, do ritmo, da precisão.
É por isso que há tantas lésbicas hoje — porque, como mostra Azul é a Cor Mais Quente, mulheres com mulheres desenvolvem maior sensibilidade ao orgasmo.
Muito do orgasmo está na cabeça da mulher.
Está na confiança no parceiro, no autoconhecimento, na coragem de comunicar o que dá prazer.
Mas a mulher se submete à visão sexual imposta pelo homem — acha normal não gozar, acha normal sentir dor, acha normal o homem gozar dentro e ela ter que cuidar dos filhos.
Os sentidos de atração entre homem e mulher são totalmente díspares.
A mulher precisa de cerca de 15 minutos para se excitar, e de 500 ml de sangue no clitóris. O homem precisa de apenas 200 — e isso em um átimo.
E já querem tirar a calcinha da mulher e meter, sem nem perguntar se ela tem desejo.
Lubrificação não é sinônimo de desejo. Quantas mulheres ficam molhadas — mas não se sentem excitadas?
Isso também vem da ignorância geral — masculina e feminina — sobre o que são as preliminares.
As preliminares começam quando você abre a porta do carro.
Quando puxa a cadeira no restaurante.
Quando elogia a roupa dela.
Quando a faz rir.
E continuam com o toque, com as palavras, com a intenção.
Muitas mulheres se excitam mais pelo que ouvem do que pelo que veem. Mas ai do homem que não cumpre o que diz.
Minhas mãos — duras e carinhosas — precisam mostrar, com firmeza e delicadeza, as intenções do meu desejo. Ela precisa umedecer já no encontro, desejando que o jantar acabe para ficarmos a sós.
Mas as preliminares não terminam no sexo.
Elas seguem depois do orgasmo — no copo de água que se leva, no chá, no cuidado. A mulher desejada é aquela com quem se quer não apenas o orgasmo, mas o sono.
Homens que não se preocupam com isso não se importam com o desejo das mulheres.
E mulheres que aceitam esses homens não se importam com os próprios desejos.
Se eu cobiçasse a mulher do próximo, preocupado com o homem, me diminuiria a eles. Mas eu só concorro comigo mesmo.
Por isso, se ela tem alguém, não me interessa. Isso é algo que ela mesma deve resolver.
Quem sabe eu não seja a salvação? Não para sempre. Mas como critério.
Não como o homem ideal — mas, ao menos, como o mínimo aceitável.