Ontem, voltando pra casa, observei os transeuntes: uns rolando o Instagram; outros, mais parvos ainda, o Facebook — curtindo cada postagem que viam sem critério algum.
Eu observava, economizando minha atenção apenas para registrar o óbvio para meu texto. Meu foco estava na aula do reservatório de dopamina.
Fico tentando fazer o exercício de imaginar o que se passa na cabeça de uma pessoa que se entretém assim no transporte público. Se o pensamento é constituído de linguagem, então qual é a qualidade — ou a falta dela — desse pensamento? Que vazio deve se passar na cabeça de uma pessoa assim?
Imagino que sejam apenas rudimentos de linguagem, como esses motoqueiros que focam em acelerar a moto só pra fazer barulho no carburador. O que será que passa na cabeça de uma pessoa assim, hein?
Eu não tenho redes sociais.
Tenho um Instagram só pra seguir pessoas que me motivam e modular um microambiente que me empurre. Quando eu pego o celular, quero ver pessoas na mesma pegada que eu.
E tenho o Recanto das Letras.
Muitos sabem que os recrutadores sondam as redes sociais para vagas. A minha rede social é o Recanto.
O que ela vai dizer ao comparar meus inúmeros artigos culturais, resenhas, minha imagem, minha identidade visual, descrição de perfil, avatar, escolha de imagens para ilustrar o texto, criatividade, erudição… — e então entrar no Instagram do meu concorrente e ver fotos dele bebendo e sorrindo numa selfie de espelho?
É por isso que não há concorrentes.
E mesmo quando comparo — eu com os namorados das garotas que namoram ou estão casadas — a diferença de imagem e conteúdo é abissal.
E se eu tenho competido… sou um competidor feroz.
Compito comigo mesmo. E meu sarrafo é alto.
Pra mim, é reconfortante saber que dei o meu melhor em cada aspecto que posso controlar.
E se as coisas não deram certo, a culpa não foi minha.
Mas o erro sinaliza o que preciso melhorar.
Se mesmo eu fazendo aparentemente tudo certo, as coisas não saíram como planejei — não vou reclamar com o destino, que não tem culpa. Ele simplesmente é.
Se mesmo tendo uma dieta top, com cardio no máximo, começando o dia às 6h e só terminando às 21h, quando me preparo pra dormir — mas em movimento mais do que parado — e ainda assim, com apenas 11% de gordura, meu corpo insiste em manter tudo no abdômen…
Eu não vou reclamar, ressentir ou parar.
Vou trabalhar ainda mais forte. Talvez refinar ainda mais a dieta, comer menos gordura ainda, menos açúcar, beber ainda mais água, me dedicar ainda mais, treinar mais forte o abdômen, esticar a corda até eu chegar no limite do meu corpo — na barreira da homeostase e no limiar da alostase.
Homeostase, no senso comum, seria a capacidade do corpo de manter suas funções.
Alostase é o que regula essa homeostase.
A alostase é onde termina a zona de conforto.
Não é uma zona segura de estar, mas é essencial visitá-la para evoluir. Senão, sua homeostase vai ser eternamente medíocre.
Quanto mais você submete seu corpo à alostase, saindo da zona de conforto, mais você aumenta seus limites homeostáticos.
É nesse limite homeostático que eu opero. E quero continuar operando — não na zona de conforto.
Muitos não fazem cardio pra não sair dela.
Eu sinto prazer em fazer o que ninguém mais vai fazer.
Se estou acomodado na dieta e no cardio, quero visitar a alostase do contrário — pra me superar.
E nesse sentido de evolução constante, é que digo: eu não tenho concorrência.
É por isso que um amor homeostático não me convém.
De alguém que eu sequer imagino fazendo cardio.
Agora, sim: eu a imagino tomando sorvete e vendo Netflix.
E não é isso que quero pra mim.