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Comumente, atribui-se ao relacionamento entre homem e mulher a toxicidade muito em função de um ciúme disfuncional de uma das partes.
Há o ciúme saudável — o do compromisso — e não o patológico, que nasce de uma ameaça, muitas vezes imaginada.
Tem a ver com a perda de serotonina, o hormônio responsável pela acomodação e estabilidade emocional, cuja diminuição está associada à percepção de uma possível perda.
Por outro lado, o ciúme saudável se manifesta por meio do elogio, do cuidado com o outro, em deixá-lo mais feliz, sair com os amigos e cuidar de si mesmo. Em suma: segurança ama em liberdade.
Já a toxicidade do relacionamento é a manipulação — às vezes inconsciente, sutil — por meio de um perfil passivo-agressivo ou explicitamente agressivo e violento, que tenta moldar o comportamento do outro através da dissimulação.
Essa manipulação pode ser expressa passivamente, num comportamento de fuga, fingimento de indiferença, silêncio calculado — tudo com o objetivo de extrair da outra pessoa o comportamento desejado.
Curiosamente, a passividade também é uma forma aguda de violência. Gandhi sabia disso ao fazer suas greves de fome ou simplesmente não reagir diante de ataques físicos. A não-reação, nesses casos, era um grito ético.
Da mesma forma, a exclusão sutil de uma pessoa de determinados ambientes ou grupos, com o fim de diminuir o seu valor, é frequentemente uma projeção do desvalor percebido por quem manipula.
Sim, o manipulador muitas vezes se odeia — e, por isso, tenta fazer com que você também se odeie.
É claro: a mulher que apanha no relacionamento vive a toxicidade mais explícita. É a violência subjetiva, física.
Mas há uma toxicidade ainda mais poderosa e perversa: a objetiva.
Aquela que opera por ênfases sutis, com frases repetidas que diminuem, com gestos que desautorizam, com o afastamento proposital de oportunidades.
O outro torna-se supostamente incapaz, infantilizado, ou é impedido de se relacionar com outras pessoas, de trabalhar, de crescer. Tudo em nome de um falso zelo que, na verdade, esconde o pavor da perda.
Mais uma vez, o ciúme e a toxicidade dizem mais sobre você do que sobre o outro.
Quem sufoca teme ser abandonado. Quem controla, não ama — teme. Quem manipula, já se perdeu de si mesmo.
Alguns relacionamentos tóxicos são mais difíceis de evitar, como os com familiares próximos. Mas, mesmo nesses, é possível controlar o ambiente para que ele te afete o mínimo possível.
Agora, se você está diante de um relacionamento tóxico que pode evitar — como o de amigos ou, principalmente, de um companheiro — é seu dever sair. Em alguns casos, denunciar.
Ficar, sabendo do que está sendo feito com você, é colaborar com seu próprio naufrágio.
Se o problema é imaginado, ele é seu.
Se é real, ele também é seu — por aceitá-lo, por se submeter a uma situação vexatória e degradante.
Em qualquer um dos casos, você é a chave da porta. A porta que pode ser aberta — ou trancada por dentro.