Como eu posso dizer isso, se sequer tenho namorada? Ou talvez eu seja um desses ingênuos que têm uma mulher e ela apenas não sabe. Ora, “minha mulher” pode ser a mulher ideal do mundo das ideias de Platão — e não precisa existir na vida real.
Aconteceu que eu tenho a sorte de já ter encontrado a minha. E ela existe. É indiferente eu ser o homem dela também. Se ela me ama reciprocamente ou não. O que meu amor por ela — minha idealização dela — tem a ver com os sentimentos dela por mim? O sentimento do outro é do outro. O meu, são meus.
Igualmente inconclusivo é o termo “mulher gostosa”. O biotipo tradicional da mulher gostosa não me agrada. Gostosa, pra mim, é a mulher agradável: um abraço, uma personalidade, um sorriso, uma ideia.
A mulher que eu gosto não é de parar o trânsito. Gostosa? Sim — mas pra mim.
Eu sempre digo que ela é mais bonita que eu. Contudo, quando chego em um ambiente social — na academia, por exemplo — não sei se é pela aparência, presença, personalidade ou elegância… mas, atualmente, meu físico chama atenção. E é comum eu perceber olhares de aprovação.
A pessoa que amo, apesar de ser muito, muito bonita, talvez nem se destacasse diante de tanta beleza física e de rosto que vejo diariamente. Ela talvez passasse despercebida em benefício de um corpo, mas não pra mim.
A aura, a elegância, o rosto, o que a pessoa comunica — ou deixa de comunicar — tudo isso faz de uma mulher verdadeiramente gostosa.
É por isso que digo: minha mulher, mesmo não sendo minha, é mais gostosa que a de qualquer um. Mais gostosa do que “gostosa”. O corpo sensual, pra mim, é o magro saudável, elegante, distinto, equilibrado — aquele que exibe sua nudez apenas a quem merecer. Hoje, isso é raro.
Já falei o que às vezes até inconscientemente chama minha atenção de modo indesejado. Minha kriptonita. O thong. Mas isso é uma febre que dá e passa.
O amor é doença que se recusa a passar. Ou melhor: mesmo quando passa, deixa sintomas. Sequelas.
E como ela é, a pessoa que amo?
“É uma mulher incrível, com um ar distraído e delicado. O nariz é um pouco empinado, mas espiritual. O formato do rosto dela é de um oval muito puro, aliás, um pouco triangular, mas a pele é radiante — de uma luz que vem de dentro.”
Eu me apaixonei por um sorriso. Por uma foto. Um pixel. Um gesto. Ou pela ausência de gesto.
Um abraço, um beijo, um perfume, uma pele ausente. Me apaixonei por tudo que é belo e imaginado. Por tudo que jamais aconteceu — ou que aconteceu de modo demasiadamente real.
Alguns sonhos são mais reais que a vida real.
E ela é meu sonho real. Porque somos feitos dos nossos sonhos — e nossos sonhos são feitos de nós.
Ela é a matéria do meu sonho e da minha realidade.
“Nela, tenha vida, e sou.”
Mesmo que não seja real, a realidade é sempre uma questão de interpretação subjetiva.