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DAVE LE DAVE
SIM, ELE MESMO
Textos

ERASERHEAD de David Lynch — #RESENHAnoRECANTO



APRESENTANDO:



Esse filme é o longa de estreia de David Lynch e, já no primeiro trampo, ele entra com os dois pés na porta da cara da bizarrice. Enigmático, perturbador, feio, surrealista, obscuro e hipnótico — características que ele não só assumiria até a morte recente, como praticamente institucionalizaria no cinema. Um gênio ou um psicótico funcional? Ambas, talvez. Não obstante, com uma das fotografias em preto e branco mais horripilantemente belas que eu jamais vi na história do cinema.

 

O filme virou clássico cult. A música da garota do radiador — que mora literalmente dentro do radiador e tem bochechas iguais às do Fofão — virou trilha do Pixies, e a banda chegou a dizer que praticamente todo mundo em Boston já tentou fazer uma versão daquilo. Ou seja: uma aberração estética que se tornou referência.

 

Quando você vê um filme de Lynch, você entra numa escala de 0 até um filme de David Lynch de incompressão. Por isso, antes de assistir, optei por pedir ao ChatGPT as chaves de compreensão do filme — mas sem spoiler. O resultado foi Impressionante: eu não entendi porra nenhuma mesmo assim.

 


 

A CAMADA SUPERFICIAL (SE É QUE EXISTE ISSO)

Na superfície, o enredo acompanha Henry Spencer, um cara tímido e esquisito que vive num mundo cinzento, industrial, distorcido e claustrofóbico. Um dia ele descobre que teve um filho com Mary X, uma espécie de bebê mutante, com cara de feto prematuro misturado com salamandra radioativa. A partir daí, Henry mergulha num pesadelo psicológico-existencial em que realidade e alucinação se misturam como farinha e LSD, que muito provavelmente, conhecendo o histórico do diretor, foi realmente a mistura que ele usou para concebê-lo.

 

O que torna Eraserhead tão único é que ele não tem narrativa linear. É um desfile de imagens, ruídos e atmosferas. Não é pra ser entendido com a cabeça, mas sentido com o estômago — especialmente se o seu estômago não for sensível a líquidos gosmentos, ruídos industriais e bebês chorando eternamente.

 


 

É SOBRE O QUÊ, ENTÃO?

Bom… dizem que o filme é uma alegoria do medo da paternidade. Foi escrito num momento em que Lynch estava, ele mesmo, enfrentando essa barra: virar pai sem querer. E dá pra ver que a experiência não foi das mais agradáveis. Se existisse bebê reborn naquela época, ele provavelmente teria preferido comprar um do que lidar com um de carne, osso e grito.

 

Aliás, se uma mãe dessas viciadas em bebê reborn assistisse Eraserhead até o final sem ter o cérebro implodido, ela não só não teria filhos, como compraria um par de gêmeos siameses reborns pra nunca correr o risco de engravidar.

 


 

CAMADAS MAIS PROFUNDAS (OU MAIS DOENTES)

1. A criança como culpa, fardo, prisão.

O bebê deformado representa o peso de uma responsabilidade que Henry nunca pediu. Ele não sabe lidar, não quer cuidar, mas está preso naquela existência.

 

2. O mundo como máquina de moer subjetividade.

Tudo em volta é mecânico, metálico, sufocante. Uma crítica ao mundo moderno, desumanizado. Henry é só mais uma engrenagem que range e sofre.

 

3. O colapso da mente masculina.

A figura feminina aparece deformada, ameaçadora ou surreal (como a Lady do Radiador). A sexualidade é distorcida, e o desejo vira horror. Tudo que deveria ser prazer vira tormento.

 

4. A mente implodindo.

No fim, quando a cabeça dele vira borracha de lápis (daí o título: Eraserhead), parece que é isso mesmo: ele se apagando, dissolvendo, sumindo do próprio pesadelo. Uma metáfora para a morte do eu ou da razão. Freud daria três pulinhos no caixão de tanta empolgação.

 


 

PRA QUEM É ESSE FILME?

Pra quem tem estômago, pra quem quer entender por que Lynch é Lynch, ou pra quem está pronto pra uma experiência estética com zero conforto e cem por cento angústia.

 

Se você estiver em crise existencial, sem paciência pra bebês chorando ou fugindo da paternidade, talvez não seja a melhor ideia. Ou talvez seja a melhor ideia justamente por isso.

 



DAVE LE DAVE II (Sim Ele Mesmo)
Enviado por DAVE LE DAVE II (Sim Ele Mesmo) em 02/06/2025
Alterado em 02/06/2025
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