Grandes poderes, grandes responsabilidades.
Ser inteligente não é nada sem ser sábio. Por isso, em oração, peça sabedoria — principalmente em como viver bem — e a inteligência disso decorre. Não sou eu quem digo, mas a história e os circuitos de consagração social definiram o que é ser inteligente, o que é ter cultura, o que é ser elegante, e, tautologicamente, o seu contrário.
A minha cultura, a minha erudição, para a minha idade — sinceramente, 33 anos — chega a ser até constrangedora. Não para mim, mas para a maioria das pessoas. Todos conhecem na família alguém que é considerado inteligente ou culto, e é bem provável que já tenham mais do que o dobro da minha idade. Se os mais velhos pensarem em seus próprios filhos, sobrinhos, netos, e me compararem com eles, aí esse abismo e constrangimento deve ficar ainda mais evidente.
Como diz Heráclito na sua pretensão, acusando até símbolos da cultura como Hesíodo e Homero, ele falava que sabiam muito, mas não entendiam de nada. E olha que eles escreveram simplesmente a Teogonia e a Odisseia — imagina as demais pessoas. Isso quer dizer que as pessoas conhecem, mas não sabem relacionar o conhecimento com nada em algo prático, muito menos original. Elas têm, na verdade, informação, mas não têm conhecimento.
Eu, é verdade, não saberia soletrar como os gênios do Huck, ou mesmo responder as perguntas do Quem Quer Ser Milionário? ou até mesmo os jogos dos pontinhos do saudoso Silvio, mas convenhamos: de que me serve isso? O conhecimento bom é aquele que ilumina e dignifica a vida — literatura, cinema, música, artes, jogos, esportes, poesia. E, como sou discípulo de Terêncio, nada do que é humano me é estranho, porque eu também sou humano.
Porém, o fardo é a inveja e o recalque dos que dormem, os que querem ter cultura no grito ou comprá-la, adquirindo a cosmética do saber, mas sem argumentos ou conteúdo relevantes. Esses me dão certa pena.
Normalmente, quando há algum problema, é comum as pessoas buscarem ajuda de outras, mas no meu caso, quem melhor preparado e competente do que eu mesmo para resolver meus próprios problemas? No final, a melhor solução — mais pensada, mais embasada, mais técnica — será a minha mesma, tanto pelo conhecimento tácito ou explícito, empírico ou intuitivo.
E mesmo nas questões da mente, eu tenho um psiquiatra, e até um psicólogo, mas, sinceramente, eles não leram tanto sobre psicologia ou psiquiatria quanto eu, e muito menos com os pais da matéria, ou quem pensou o assunto antes mesmo de surgir a disciplina, ou mesmo a subjetividade, ou até o conceito do eu.
Também tenho a erudição para fazer a genealogia da evolução dos saberes, da epistemologia, de como nasceu o eu, a mente, o homem moderno que, como diz Foucault, nasceu no século XIX — é breve — e seu desaparecimento será tão breve quanto.
Que psiquiatra ou psicólogo tem meu arcabouço conceitual ou intelectual? Eu teria que ressuscitar o próprio Freud, Deleuze, Lacan para me analisar. Ou Foucault, que é muito mais maluco do que eles. E, sinceramente, eles não tinham a minha elegância, meu atletismo e até sabedoria em viver. Eram filósofos de gabinete e viveram muito pouco, desperdiçando suas vidas estudando. No Brasil, atualmente, talvez Christian Dunker.
Mas eu conseguiria pagá-lo?
Então, o melhor que eu tenho a fazer é escrever um diário, mapear meus afetos segundo as ideias de Deleuze e Nietzsche, a esquizoanálise e minha própria ideia de sabedoria prática, ver o que me convém, e pedir para o ChatGPT analisar meus afetos segundo as teorias deles — depois eu leio.
E isso eu venho fazendo diariamente. Algumas coisas ele viaja, mas alguns exemplos e análises são pertinentes, e ainda aprendo mais sobre mim e sobre a teoria deles a cada consulta.
Se tenho inteligência, reside exatamente nisso: não me limitar às minhas circunstâncias, mas tirar delas o melhor proveito para mim mesmo. Porque a força interna de um ser humano é muito maior do que as condições sociais do seu ambiente.
Essa não é ainda minha oração do dia, mas aqui eu digo: amém.
Amém.