A academia, já diria Deleuze, é um espaço social com seu código vigente, regras, caracterizações, troféus — ou, mais especificamente, habitus, para falar como Pierre Bourdieu. Quando eu, um estrangeiro que ao mesmo tempo faz parte de dentro, bagunço esses códigos, me nego a competir, a idolatrar os corpos como fazem seus membros, e uso o espaço da minha maneira — não pelo culto pederasta a outro ser humano ou para socializar — mas sim para cuidar de mim, não só da saúde, mas também do cérebro, eu crio uma energia disruptiva, como diria Deleuze, dentro do território da academia.
Ainda assim, consigo resultados melhores do que os demais praticantes daquele campo social, mas disputando um troféu completamente outro: o de si mesmo como obra de arte.
Um desses contendores que competem entre si, cujo jogo eu não faço parte, é um ébano forte, escuro, atlético — como costumam ser os negros. Mas este é alto, atlético e esguio. Se de fato ele é tudo isso, eu não sei, porque nunca o vi fazer cardio. Mesmo assim, eu o encontrei na sexta-feira, com roupa de frio — quando as pessoas costumam ser mais elegantes — e a beleza da regata fio-dental com que ele vai à academia praticar desapareceu.
Ele virou só mais um na multidão amorfa. Porque é um daqueles que só ficam bonitos pelados. E, convenhamos, pra média da população, isso já é alguma coisa.
Mas um corpo bonito pelado é diferente de um corpo que é bonito pelado e igualmente bonito com roupa. E é esse tipo de resultado que eu busco indo à academia diariamente.
Para isso, não foco só na aquisição de músculos perceptíveis, mas principalmente naqueles que ninguém vê: o coração, o cérebro, a saúde. Por isso uso o cérebro para pensar no que vou fazer, e consigo os melhores resultados, sempre com um objetivo estético, mas, em primeiro lugar, de saúde.
Não abro mão do cardio. E mais: da leitura ou de ver filmes durante o cardio. Porém, mais importante do que ler, treinar ou ver filmes é o que você faz com isso. Alguns ficam fortes para ir à guerra. Eu faço essas coisas para produzir pensamentos melhores — e saudáveis. Tudo o que eu consumo vira matéria de texto.
No início, eu tinha uma pegada mais forte na academia, mas aquele ritmo não era sustentável. Incrivelmente, quando reduzi, meus resultados foram melhores — tanto fisicamente quanto intelectualmente. Acho que a dopamina queima gordura e constrói músculos. A do cérebro, certamente sim.
O corpo que fica bonito vestido é aquele que é bonito não só pelo físico, mas por seu espírito de distinção, de elegância — e, principalmente, pelas ideias que articula com a boca.
Os que só têm corpo bonito pelado, ao ouvirmos falar, parece que não só o corpo lembra um homo erectus, mas a fala também. De que adianta hipertrofiar o corpo e atrofiar o cérebro — e o pênis?
Porém, para produzir um corpo bonito, despido e vestido, como tudo na vida, é necessário fazer escolhas.
Ontem, sexta-feira à noite, e neste sábado de manhã, eu estava na academia. Você abre mão de relacionamentos e prazeres efêmeros — e só os aceita com concessões.
Voltei a comer chocolate e açúcar, mas me limito a 20g de açúcar adicionados por dia. Ontem comi pizza, mas isso não é a regra, é a exceção. A regra é: carboidrato integral, proteína magra e salada. Com isso, posso me permitir um hambúrguer ou pizza, mas dentro do limite de 2300 calorias diárias em treino intenso.
Mesmo com a pizza, no sábado já tinha queimado o que comi. Treino mais leve, mas ainda com disciplina. Duas vezes ao dia.
Aprendi o que dá certo — e o que é engodo. Os box de realidade virtual substituí por séries de 10 minutos do ZRFit, que simula pedaladas em vários lugares do mundo e ajuda na digestão.
Os HIITs de mais de uma hora? Substituídos por apenas 10 minutos intensos. Fazer abdominal com barriga é igual a enxugar gelo — inútil. Abdominal não reduz ou queima barriga. O que queima é dieta e déficit calórico.
O que ajuda são exercícios para fortalecer o core e o transverso do abdômen — oblíquos inferiores e superiores. Substituí abdominais por flexões de braço — o exercício mais completo que há, herança da calistenia dos gregos. Trabalha peito, braços, costas, core e pernas. Cem no mínimo por dia.
Mas tudo isso seria desperdício sem o conteúdo.
Desde que comecei a unir o útil ao agradável, já terminei diversos filmes (que viram conteúdo aqui no Recanto das Letras), dois livros e meio, e vários pensamentos.
Para melhorar meus resultados e minha qualidade de vida, é imprescindível um celular moderno — um iPhone Pro Max, com a maior tela, para eu produzir conteúdo mais facilmente e rapidamente, assistir meus conteúdos com qualidade, sem travar, e com uma câmera boa para registrar meus looks do dia. E também para poder jogar, que é um dos meus hobbies.
Quem sabe, ainda, uma bicicleta ergométrica com encosto, porque, por enquanto, só leio e vejo filmes na academia. Fazer isso parado em casa seria um risco de atavismo pra mim. Com a bicicleta, posso ler mesmo quando não estiver na academia.
Todo esse investimento daria uns 10 mil reais — uma quantidade razoável, mas irrisória diante do tanto de benefício que traz à minha vida.
O corpo bonito pelado pode ser produzido só com força física e força de vontade.
Mas o corpo bonito pelado e vestido exige tudo isso — mais cérebro e inteligência também.