Pai, o Senhor criou tudo o que há, viu que era bom, se deu por satisfeito e resolveu descansar um pouco. Afinal, o Senhor também é filho de Deus — digo, o Senhor é o próprio Deus.
Já eu não descanso nunca, Pai. Eu não posso me permitir descansar. Mas a Sua sabedoria é divina; a minha, humana. Me falta experiência e vivência para saber quando descansar sem comprometer minha rotina.
Já aprendi — ou estou em uma fase — que minha dieta não precisa mais ser tão retilínea, e que não uso mais agenda.
Balzac dizia que profissionais autônomos, que não costumam receber ordens diretas, como advogados e médicos, continuam presos às suas agendas. Que essas são carrascos piores que qualquer patrão. E penso que ele estava certo, Pai.
O homem é condenado a ser livre, a escolher, e não a agir dentro de um protocolo — mesmo que estabelecido por ele mesmo, via agenda. A vida é improviso. Viver é quando a virtù encontra a fortuna. O talento com a sorte. A capacidade com o destino.
Agenda é só um norte. Um planejamento. Não devemos ficar presos a ela.
E vivo com uma intuição bergsoniana sobre os alimentos que devo comer. Obedeço às calorias de uma dieta rigorosa, sim, mas principalmente à regra do meu corpo: o que é bom é o que me faz bem. E o mal, tautologicamente, é o que me piora.
Mas isso vem só com vivência. Com maturidade.
Não me falta força de vontade para alcançar meus objetivos. Me falta o caminho. Me falta experiência.
Então eu peço sabedoria para descobrir os atalhos e os caminhos por mim mesmo, Pai.
Seu maior inimigo, dizem, é o Diabo. Mas não porque ele é sábio — e sim porque ele é velho. Ou seja: experiente.
Mas há aquela frase que é muito comum — dita pelo bobo ao Rei Lear, de Shakespeare:
“Pobre Rei Lear, que ficou velho e não ficou sábio.”
São os velhos que ficam tolos com o tempo. Têm prazo de validade. Mas a experiência deveria ser como vinho ou uísque: que melhora com o tempo.
Os que se tornam tolos são alimentos que apodrecem.
Então eu Te peço, Pai: faça de mim um alimento imperecível, pela Sua vontade.
E na Sua criação, que citei acima, a Sua magnum opus, sem dúvidas, foi a mulher.
Um amigo, um mito, uma vez me disse que se eu orasse ao Senhor, o Senhor, que conhece os corações e desejos recônditos, me mostraria a mulher ideal. Eu não cheguei a dobrar o joelho para pedir… mas, na Sua boa vontade, Deus, me concedestes esse encontro com a mulher perfeita para mim.
Gostaria que o Senhor exercesse a graça ainda maior: a proeza — talvez o milagre — de nos reencontrarmos para nunca mais nos separarmos.
E quanto bem a companhia dela me faria… Mais do que a ausência presente já me faz.
Com ela, não precisaria mais de nada. Com ela, teria tudo. Me pouparia de muitos infortúnios com outras mulheres, porque só ela me bastaria. E eu não teria mais que me preocupar com esse assunto.
Conceda-me essa graça. Como um Pai que presenteia um filho bom. Embora meu pedido seja muito alto, é pelo valor sagrado de quem eu peço.
Amém.