Há um erro comum em afirmar que certos livros são “para crianças”. Obras como Alice no País das Maravilhas, O Mundo de Sofia, O Pequeno Príncipe, a série A Bússola de Ouro de Philip Pullman, As Aventuras de Gulliver e as histórias de Júlio Verne são, na verdade, atemporais, universais, sem idade definida. Todos podem extrair ensinamentos valiosos dessas leituras, independentemente da fase da vida.
Uma das cenas mais clássicas de Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll, é quando Alice, perdida, pergunta ao Gato de Cheshire qual caminho deve seguir. Ao perceber a indecisão dela, ele responde: “Ora, se você não sabe para onde vai, qualquer caminho serve.”
Qualquer caminho é bom… para chegar a lugar nenhum.
Essa filosofia é o completo oposto da música “Deixa a vida me levar”, de Zeca Pagodinho. Ora, se você está diante de uma correnteza e de um penhasco, a vida vai te levar inexoravelmente para a morte — ou para um caminho destrutivo. Não dá para prever a fortuna com exatidão, mas é possível percorrer o caminho mais seguro. Para isso, é preciso ter um objetivo.
O Waze pode te indicar a melhor rota, mas ele não te tira do lugar se você não souber dirigir — e principalmente se não tiver um destino inserido. Assim é a vida.
A filosofia de se deixar guiar pela vida e pelo acaso é o avesso da contingência de Sartre, que afirma que o ser humano é livre para moldar-se de acordo com suas ações. Também contraria o princípio filosófico da necessidade, que diz que tudo é exatamente como é e não poderia ter sido diferente, resultado de uma cadeia inevitável de causas.
Não saber o caminho é tão nocivo quanto errá-lo. Como na piada do sujeito que entra num prédio e, ao ser questionado pelo ascensorista sobre a qual andar deseja ir, responde: “Qualquer um, já errei de prédio mesmo.”
Ora, se você segue ou escolhe o caminho errado, todo destino ou objetivo também será errado, pois não está de acordo com o processo, com o plano estabelecido, com o objetivo real.
A sabedoria popular diz que sorte é quando o talento encontra o acaso. Em O Príncipe, Maquiavel chamaria o talento de virtù e o acaso de fortuna. O sucesso do príncipe dependeria da sua capacidade de usar sua virtude contra a força da fortuna. E quanto mais virtù temos, mais fácil é lidar com as incertezas da fortuna.
A sorte, nesse sentido, pode ser comparada a um homem careca: você não consegue pegá-lo pelo topo da cabeça, porque ele escorrega. É preciso imobilizá-lo. Tackeá-lo como um linebacker jogando na secundária defensiva do futebol americano.
E aí? No GPS da vida, você já definiu sua rota? Já escolheu o local onde quer chegar? Seus objetivos?
Mesmo que, em algum momento, seja necessário recalcular a rota com a voz esganiçada da sua namorada, esposa ou da assistente virtual do GPS dizendo que você está no caminho errado, lembre-se: ela só te direciona. Quem escolhe o destino é sempre você.
Negar isso é cair em má-fé sartreana.