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DAVE LE DAVE
SIM, ELE MESMO
Textos

Você já se DECEPCIONOU no Recanto das Letras?



O peso da ilusão

Talvez “decepção” não seja a palavra mais adequada. “Ilusão” me parece mais precisa. Um conceito fundamental em Freud é que a ilusão não é simplesmente um erro qualquer, mas um tipo especial de erro — aquele que nasce do desejo. Iludimo-nos com aquilo que desejamos que fosse verdade. Ele explica isso de forma brilhante em O Futuro de uma Ilusão, ao tratar da crença em Deus.
 


 

Uma ilusão ambulante

Para mim, o site em si tornou-se uma ilusão ambulante. A princípio, criei meu perfil com o desejo de me reaproximar de uma pessoa que, no fundo, talvez nem exista mais. Cheguei a acreditar que ela nutria sentimentos por mim, que me acompanhava secretamente, criando perfis anônimos apenas para se sentir mais próxima. Tudo fruto do meu desejo. Tudo ilusão.
 


 

A ilusão em dobro

E a ilusão, nesse caso, foi em dobro.

 

Primeiro, pela ausência de interação comigo. Enquanto eu deixava comentários profundos e afetivos, essa usuária respondia com entusiasmo a autores banais — o que me pareceu tão incoerente, tão improvável, que só consegui interpretar como um sinal secreto: “só pode ser ela, a pessoa que amo, escondida, me testando, me provocando de algum modo”.

 

A mente apaixonada vê sinais onde há apenas silêncio. E esse silêncio, em vez de afastar, me puxava para mais perto da fantasia. A ausência se tornou presença. A recusa, um código secreto. Tudo alimentado por uma esperança cega de reencontro, quando, na verdade, o que havia era o eco do que nunca existiu.
 



Entre afetos e máscaras

Mas a ilusão não se limitava a ela. Estendia-se a outros usuários que, por um tempo, julguei serem amigos. Alguns se mostraram verdadeiros. Outros, definitivamente não.

 


 

Entre o sublime e o medíocre

E quanto à qualidade literária da plataforma? Tirando raras exceções, ela é muito baixa. A mediocridade reina — inclusive no que diz respeito ao bom gosto, e até mesmo aos comentários.

 

Comentei em textos de uma usuária que cheguei a confundir com a pessoa que amo. Fiz observações que considero pertinentes, honestas, até elegantes. Nunca tive sequer uma visita de volta. Enquanto isso, outros usuários — sem talento, sem atrativo, com comentários vazios — recebem sua atenção. Essa mesma pessoa que supostamente admira Kafka, Clarice, Pessoa. Eu nunca vou entender como alguém com tal gosto literário prefere o proselitismo raso à minha presença.
 


 

O falso brilho da superficialidade

Certamente, não é porque sou “fake” — afinal, poucos se expõem tanto quanto eu, e com o garbo e a elegância que ofereço. E não é a primeira vez que meus comentários elaborados são ignorados em favor de um “69 literário” de quem sequer leu o texto. Isso é, no mínimo, curioso.
 


 

O que permanece

Apesar disso, continuo seguro da qualidade e originalidade do que produzo. E isso, eu sei, não é ilusão. Quem não reconhece, só posso lamentar. Como dizia Nietzsche, aquilo que tem valor não precisa ser demonstrado. Se não é reconhecido, só pode ser inveja. Ou recalque. Ou ambos.

 

A reação dos outros, eu não controlo. Mas posso controlar a minha. E a minha decisão é clara: continuar. Continuar meu processo de criação — externa, nos meus textos; interna, na construção de mim mesmo.

 

É como em Pierrot le Fou, de Godard: há dias em que você só encontra idiotas — e acaba desconfiando de si mesmo

 

 

DAVE LE DAVE II (Sim Ele Mesmo)
Enviado por DAVE LE DAVE II (Sim Ele Mesmo) em 16/04/2025
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