A autoajuda, que é o contrário de filosofar, vive dizendo que o mais importante na vida é ter disciplina, porque ela vende fórmulas prontas que servem pra qualquer um sem levar em conta a individualidade de cada ser vivo. Mas disciplina nada mais é do que o modo como os poderes controladores da sociedade moldam e estruturam o corpo para torná-lo dócil, como diz Foucault. O ser humano, que antes era potente e singular, é domesticado, transformado em um animal de rebanho, fraco, obediente. Assim como um cachorro aprende tarefas pela repetição, o homem disciplinado se torna previsível, condicionado. O que era forte nele—seus instintos, sua reação imediata aos estímulos da vida—é esmagado pela sociedade, que impõe regras e limites.
Nietzsche exemplifica isso na segunda tese da Genealogia da Moral, quando fala da “besta loira”, os guerreiros que assolavam a Europa, antes de serem enfraquecidos pelos valores morais dos fracos e dos sacerdotes. Eles olhavam para esses guerreiros e diziam: “Ele é mau, e eu sou bom, porque internalizei meus instintos.” Foi assim que a moral dos ressentidos venceu: não com força, mas com culpa. Quando o homem internaliza as regras sociais, ele se torna disciplinado, e as instituições de correção—prisões, clínicas de recuperação, hospitais psiquiátricos—estão aí para isso. O indivíduo só é considerado “recuperado” quando deixa de ser um problema, quando aprende a obedecer. Mas isso não é recuperação; é domesticação. Ele não voltou mais forte. Pelo contrário: foi amansado.
Por isso, ser disciplinado é ser controlado. Disciplina é coisa de organismos fracos, de forças reativas. Quando eu decidi parar de usar drogas, ter uma rotina saudável, cortar porcarias da alimentação, praticar exercícios, me tornar um ser esteticamente bonito, tanto vestido quanto pelado, não foi por disciplina. Eu sou caótico. Minha mente funciona no caos. Mas o que me fez mudar foi minha vontade de potência—ou, como chamam no senso comum, força de vontade. Isso é energia que quer se afirmar no mundo, que quer ser cada vez mais, que quer se expandir. E, no meu caso, influenciar, conquistar, seduzir.
Minha organização diária é um reflexo das minhas forças ativas. Elas estão fortes, e por isso durmo cedo, cortei o açúcar, trabalho, estudo, treino e crio com a mesma intensidade. Tudo isso visando o aproveitamento máximo da minha potência. Com consistência, sendo minha melhor versão a cada dia. Me esforcei hoje ao máximo. Amanhã, tudo de novo. Depois, de novo. E de novo.
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Me prestigiem aí, seus vagabundos!