Um experimento curioso colocou números nas testas das pessoas, de 1 a 10, e deu a elas a missão de buscar o maior valor possível, sem que soubessem qual era o seu próprio número. O resultado foi previsível: os de números altos eram disputados como prêmios em um programa do Silvio Santos, enquanto os de menor valor ficavam esquecidos.
No mercado afetivo, a lógica não é muito diferente. Buscamos parceiros com “números altos” porque, além do desejo, há também a influência social – estar ao lado de alguém de menor valor pode afetar a nossa própria imagem. Por outro lado, um parceiro considerado “inferior” pode trazer segurança, diminuindo o medo da traição. Assim, muitas pessoas acabam se contentando com parceiros de “valor menor”, mas a tendência natural da vaidade é sempre buscar alguém ligeiramente acima – um ou dois números a mais. Só não exageramos porque, caso contrário, a própria sociedade adverte: “É muita areia pro seu caminhão!”
Essa frase, geralmente associada à aparência, pode também se referir a outros desníveis – intelectual, financeiro ou até ao modelo idealizado de parceiro, aquele amor platônico que parece inalcançável.
Veja o caso do meu cabeleireiro. Ele me contou sobre um instrutor da academia que, além de forte e musculoso, sempre está com a barba bem-feita. O detalhe curioso? Esse “mero instrutor” é, na verdade, o dono da academia. Mas o cara é tão humilde que nunca mencionou isso.
Ganhou meu respeito na hora. No dia seguinte, quando o vi treinando no mesmo horário que eu, trocamos cumprimentos e resolvi elogiá-lo, tanto pela humildade quanto pelo fato de ser um empreendedor brasileiro. Conversamos bastante, e ele me disse que veio da quebrada e jamais “daria carteirada”.
Além de empresário, ele é um personal trainer excelente, com um conhecimento técnico que se reflete na sua própria imagem. Ele treina bem, se expressa bem e ainda administra um aplicativo de treinos que eu mesmo utilizo. Mas o comentário do meu cabeleireiro foi outro: ele disse que a mulher do cara tem um corpo bacana, mas está “envelhecendo no rosto” e que, na opinião dele, ela “não vai segurá-lo” por muito tempo. E que ele é muito areia pro caminhão dela.
Minha visão é um pouco diferente. Homens bonitos, sarados e bem-sucedidos geralmente não se contentam com uma única parceira, mas se ela continua sendo a principal, é porque existe amor.
O amor, afinal, é uma ferramenta biológica para evitar traições indiscriminadas. No jogo afetivo, onde todos buscam parceiros com “números altos na testa”, ele funciona como um mecanismo de fidelização – um laço que nos impede de trocar constantemente por alguém que, teoricamente, tem um valor maior.
Mas há uma reflexão importante aqui: a beleza e a aparência, por mais valorizadas que sejam, não são bens permanentes. Por isso, o cuidado de si deve ir além da estética. Cultura, instrução, boa comunicação e elegância são atributos que, com o tempo, se sobressaem e podem até se tornar mais belos do que a juventude, pois carregam a experiência de anos vividos.
Levando tudo isso em consideração, avalio-me como um ativo de alto valor no mercado afetivo. Cuido do corpo, tenho uma aparência invulgar – bela, diriam alguns. Meu rosto, simétrico, combina traços viris com um ar pueril que contrasta com meu porte físico esbelto e definido. Mas não basta apenas ter músculos visíveis; meu corpo só é belo porque reflete um cérebro que pensa, uma boca que articula bem as palavras e uma mão que escreve com elegância.
Meu bom gosto se estende às roupas que visto – ainda que, despido, o corpo já tenha sua própria beleza. Minha inquietação criativa, meu desejo de empreender e converter meu capital cultural, profissional e até sexual em financeiro fazem de mim um ativo de alta cotação. O belo corpo, saudável, que produz bons pensamentos e com conteúdo e trajado com elegância. E é sabido que às pessoas valem pela sua raridade. É por isso que quem ganha mais é o campeão de boxe mundial, porque só tem um. E Dave Le Dave também tem um só.
E, com base no dito popular, só posso concluir: eu sou muita areia pro caminhãozinho de vocês!