Não irei mencionar Sidney Magal, meu gosto musical é mais apurado. Acho Sangue Latino, dos Secos & Molhados, uma das melhores letras, melodias e canções da música brasileira.
Embora minha avó fosse mais escura do que eu, ela dizia que sua avó Júlia tinha olhos azuis como pedra de anil. Segundo ela, era senhora de engenho. Apesar da improbabilidade, nunca questionei, porque a imagem era pura poesia.
Talvez meus antepassados sejam italianos e tenham herdado o trabalho na fazenda dos negros. Isso explicaria minha energia italiana, minha predileção pelo Palmeiras e meu gosto por variações de massa, molho e queijo!
Eu não sou homem, sou dinamite. E por pouco não evito a combustão. Com grande dificuldade, impeço as chamas de tremularem para fora do meu corpo, então, quem quiser se aquecer junto a mim pode acabar se queimando.
Meus escritos refletem meu fervor. Estou com 33 anos, essa idade mística, o auge físico e intelectual. A idade de Cristo, acho que também de Buda, e o momento em que Zaratustra teve sua aurora.
Nietzsche, além de filósofo, era um excelente médico e fisiologista. Sabia identificar sinais de fraqueza e debilidade. Essa fuga das pessoas mais velhas da emoção, essa busca pela paz, pela ausência de conflito, por atividades calmas como bingo, bocha, baralho, cuidar de plantas e jardins — embora poética — é sintoma de organismos débeis e fracos. Velhos puristas de poeira.
E essa busca por mundos supraterrenos, por místicas esotéricas desconectadas da realidade concreta — a única que existe — é um sinal claro de decadência.
É simbólico o filme Muito Além do Jardim, de Hal Ashby, em que Peter Sellers interpreta um jardineiro zeloso, mas inculto, dócil, elegante e pacato, que imita tudo o que aprende na TV e com seus senhores. Por isso, passa-se por nobre, mesmo sendo de poucas letras.
Quem cultiva um belo jardim tem algo de belo dentro de si, ainda que seja inculto. E essas pessoas enganam. Passam-se por nobres — mas apenas para os incautos.
A potência se revela na arte. O cinema é a arte jovem por excelência, onde os mais jovens brilham. Foram eles que fizeram a Nouvelle Vague, o Cinema Novo, a Nova Hollywood, o spaghetti western, o cinema independente. E, quando diretores mais velhos ainda produzem boas obras, é porque permanecem jovens em espírito e força criativa, como Michael Haneke.
O mesmo acontece na música eletrônica. Daft Punk e David Guetta fazem parte do gênero, mas dá para dizer que são iguais? As batidas de Guetta são inofensivas, sem força, enquanto o Daft Punk lançou álbuns como Human After All e Random Access Memories, que revelam a potência da criação, o sangue que ferve—e não a inofensividade.
Na arte e no amor, o sangue deve ferver.
Na cama, sou um amante italiano; na arte, um pintor latino renascentista, como Da Vinci ou Rafael.
E meu sangue, latino, ferve por você.