Eu chamaria esse texto, inicialmente, O Mundo de Eclesiastes ou AINDA Te Amo, mas, considerando o teor do que irei abordar e o fato de que boa parte dos meus leitores e comentários vêm do sexo feminino, acho que o título atual, Texto-Suicida, além de ser mais instigante, sugere melhor o efeito que ele pode provocar.
Pela minha experiência com o sexo frágil — que, de frágil, não tem lá muita coisa, como a rosa que se protege com espinhos — percebo que elas aceitam facilmente meu histórico com a dependência química, até mesmo minhas aventuras eróticas, que fazem parte do pacote. Mas o fato de eu ainda amar alguém do passado, um sentimento meio platônico por uma pessoa cujo rosto mal conheço, cujo beijo nunca senti, cujo perfume jamais aspirei… isso, para elas, é intolerável. É algo difícil de aceitar.
Eu já escrevi, em outra crônica, que as mulheres podem aceitar que existam outras mais belas, mais ricas. Mas aceitar que outra desperte uma paixão maior do que elas próprias são capazes de despertar — isso é difícil para elas.
O paralelo que encontro com o livro de Eclesiastes é que, mesmo entre os intelectuais de postura cética em relação à Bíblia, ele segue sendo um dos mais valorizados. Talvez porque não se prenda à doutrina, mas à sabedoria de viver. Diz-se que foi escrito pelo rei Salomão. Machado de Assis, por exemplo, era grande entusiasta daquilo que chamou de o mundo de Eclesiastes. E uma passagem marcante resume exatamente o que acabo de relatar:
“Vaidade de vaidades, diz o Pregador, vaidade de vaidades! Tudo é vaidade.” (Eclesiastes 1:2)
Essa frase icônica define o tom do livro, enfatizando a efemeridade das coisas materiais e das ambições humanas — e a ideia de que tudo na vida é passageiro.
E o amor que ainda nutro por uma pessoa cuja imagem é apenas um reflexo — como num espelho, no mar ou na projeção de uma sombra. Talvez seja um reflexo no lago da minha própria imagem que, se tentasse beijar, assim como Narciso, me afogaria. A presença da pessoa amada se traduz em ausência, e, portanto, em dor. E, por mais que minha página tenha existido com o propósito de nos aproximar ao longo de quatro anos, fracassei nesse objetivo. Quando tentei entrar em contato com a pessoa real, romper a névoa das sombras, atravessar a projeção da minha própria imaginação, fui prontamente rechaçado — mais do que isso, ameaçado com advogados e polícia.
Por mais traumática que tenha sido a experiência, não se esquece alguém de uma hora para outra, mesmo diante de todas as evidências. Mas tento transformar o poder das palavras em um exorcismo, expulsar o fantasma de sua presença, dissolver a marca indelével que deixou na minha pele e na minha alma. Enquanto isso não acontece, escrevo. Afirmo, como num ato suicida, que ainda te amo. Mas prefiro acreditar em outra passagem de Eclesiastes:
“Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo propósito debaixo do céu:
Tempo de nascer e tempo de morrer; tempo de plantar e tempo de arrancar o que se plantou;
Tempo de matar e tempo de curar; tempo de derrubar e tempo de edificar;
Tempo de chorar e tempo de rir; tempo de prantear e tempo de dançar;
Tempo de espalhar pedras e tempo de ajuntar pedras; tempo de abraçar e tempo de afastar-se de abraçar;
Tempo de buscar e tempo de perder; tempo de guardar e tempo de lançar fora;
Tempo de rasgar e tempo de coser; tempo de estar calado e tempo de falar;
Tempo de amar e tempo de odiar; tempo de guerra e tempo de paz.”
(Eclesiastes 3:1-8)
Essa passagem nos lembra que tudo acontece no momento certo, segundo uma ordem que transcende o entendimento humano. A paciência e a aceitação do fluxo natural da vida são virtudes essenciais para evitar a angústia da pressa e do imediatismo.
No momento, é meu tempo de semear. Foco em mim mesmo, na minha própria aparência, no cuidado com o meu corpo. Honestamente, não estou focando no intelecto — já o fiz em demasia. Absorvi conhecimento o suficiente para hibernar por um tempo, como o urso no inverno, ou como a abelha, que, após coletar o néctar, agora se dedica a distribuir o mel. O pote transborda, e procuro mãos que se estendam para receber minhas dádivas.
É hora de cuidar do corpo e da aparência, que, afinal de contas, são a matéria-prima do pensamento. O segredo para fazer algo bem — qualquer coisa — está em dar o seu melhor e em fazê-lo com consistência. Sem essas duas coisas, não há maestria, não há colheita, apenas desperdício de potencial.
Penso em um filme clássico, Campo dos Sonhos (Field of Dreams, 1989), dirigido por Phil Alden Robinson. Não sou particularmente atraído pelo tema — beisebol nunca me cativou —, mas há uma cena icônica que se encaixa perfeitamente no que digo. No filme, Ray Kinsella, interpretado por Kevin Costner, ouve uma misteriosa voz sussurrando: “Se você construir, eles virão.” Movido por essa intuição quase mística, ele decide restaurar um antigo campo de beisebol em sua fazenda. No início, a ideia parece absurda, mas, à medida que o campo toma forma, jogadores lendários começam a aparecer, vindos do além, para uma última partida.
A mensagem é clara: cuide de si, que eles virão. Ou, parafraseando no que me cabe, cuide bem de si, que ela virá. A pessoa certa virá. No tempo certo. Se não no tempo de Deus, no tempo do acaso, do destino — ou simplesmente no tempo natural das coisas.