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DAVE LE DAVE
SIM, ELE MESMO
Textos

Quando a fome do Corpo encontra a da Alma

Há uma sede que precede o pensamento, assim como a formula sartriana que enuncia que a existência precede a essência, é um desejo que ecoa nas camadas mais profundas do ser. Não é fome de pão, nem sede de água — é a ânsia pela tua presença, o chamado silencioso de algo que só se sacia na tua entrega. Quando imagino tua pele roçando a minha, o toque deixa de ser apenas físico e se transforma em uma reverência aos segredos do universo. É como se, no encontro dos nossos corpos, os deuses sussurrassem verdades esquecidas.

 

Aqui não há razão, nem espaço para cálculos. Influenciados pelo deus Dionisio, o que nos move é o instinto puro, a verdade que antecede palavras ou promessas. O corpo fala na linguagem das pressões e pulsações, e cada toque teu escreve em mim versos que a mente jamais poderá traduzir. Não existe má-fé nesse instante, pois somos absolutos e inteiros no momento em que nos deixamos ser.

 

Teu perfume não é apenas um aroma — é um sortilégio que invade minha consciência e me enreda em memórias de tempos imemoriais e esquecidos. É como se, em algum lugar, nossas almas já tivessem dançado juntas, se reconhecendo em movimentos ancestrais, um balé onde não há começo nem fim. Apenas o eterno-retorno nietzscheano no qual o desejo que não sabe nomear-se, mas que exige ser vivido e revivido, eternamente.

 

Se o amor é uma escolha, escolho a servidão.

Se a servidão é um labor, escolho jamais descansar. No amor, há uma forma de servidão voluntária, como denunciava Étienne de La Boétie. Assim como ele dizia amar seu amigo Montaigne ‘porque era ele, porque era eu’, da mesma forma, eu te amo: porque és tu, porque sou eu.

Mas sei que essa escolha não me pertence; é o universo que nos convoca, tecendo um destino que não podemos negar. Na tua ausência, o desejo se torna dor. No teu toque, ele se dissolve em êxtase. Entre nós, a liberdade não é algo perdido, mas algo transcendido — o desejo nos torna cativos, mas é nessa prisão que experimentamos a plenitude.

 

É no limiar entre o pensamento e a carne, entre o espírito e o suor, que a verdade se revela. O que somos não cabe em regras ou julgamentos; somos o pacto entre corpos, a comunhão entre almas que se reconhecem em sua vulnerabilidade mais crua.

 

Teus olhos me despem com mais precisão do que tuas mãos. Mesmo o teu silêncio comigo, comunica mais que a retórica dos mais famosos sofistas, há um grito que arrebata minha alma e me coloca aos teus pés. Quando me olhas assim, sinto que carrego o peso de todos os desejos do mundo. E não me resisto. Não quero resistir. Quero me render, ser tomado pelo fogo que tua presença acende, ser consumido até que nada mais reste além de nós dois.

 

No clímax, não existe fronteira entre o que é meu e o que é teu. Há apenas um momento suspenso no tempo, onde nos tornamos mais do que corpos, mais do que espíritos — nos tornamos um só, perdidos no espaço etéreo da eternidade.

 

E quando o silêncio nos envolve, quando a respiração se aquieta, resta apenas a certeza de que, por um instante breve e absoluto, fomos imortais.

 

DAVE LE DAVE II (Sim Ele Mesmo)
Enviado por DAVE LE DAVE II (Sim Ele Mesmo) em 24/12/2024
Alterado em 24/12/2024
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