A sabedoria popular das pistoleiras de redes sociais escreve nos perfis: “quem se define, se limita”. Filosoficamente, também não acredito em definições. Elas são fronteiras artificiais que reduzem o indivíduo. Eu gosto mesmo é do ambíguo — dessa coisa dúbia dos contrários que não se anulam, mas se unem. Como o andrógino, que é um equilíbrio tensionado, embora predominantemente de um sexo.
Esse é o grande estilo nietzschiano: a união entre o apolíneo e o dionisíaco, entre o atleta e o intelectual. Reduzir o homem a uma dicotomia já é diminuí-lo. Nada combina mais com o pensamento do que o movimento e a atividade física.
Porém, é fato: alguém ligado à vida intelectual ser visto com frequência em atividades mundanas — churrascos, festas, eventos sociais — soa estranho pra mim. O pensamento exige silêncio e solidão. O barulho da multidão impede as ideias originais, confunde nosso pensamento saudável com a massa ignara.
Heráclito já sabia disso. Era uma figura quase eremita, misantrópico, sisudo, de difícil trato. Não se misturava com o vulgo: primeiro porque eles não entenderiam o que ele dizia; segundo, porque não tinham nada a lhe acrescentar. Preferia falar para um ou dois, desde que tivessem ouvidos longos — não só no sentido anatômico, mas simbólico, ou seja, capacidade de escuta.
Assim também é Zaratustra, o profeta por trás de Nietzsche. E assim sou eu. Filósofos não se veem por aí socializando, perdendo tempo com o populacho. Foucault ficava com seus livros e a poeira deles, até a hora de ir pro bacanal gay — que era o que ele gostava mesmo. Deleuze, nem isso. Tanto é que, quando sua saúde o impediu de continuar estudando, lendo, pensando, se jogou da janela do oitavo andar, como canta Clarice Falcão, aquela gata.
Kant não teria escrito o que escreveu depois dos 40 se tivesse uma conta no Instagram. E mesmo eu — mesmo na multidão, mesmo cercado de gente — continuo sozinho. Tenho os poucos amigos que me cabem. Mas mesmo diante deles, estou só.
Em cada momento da vida, tenho um amigo de preferência. Mas o momento muda. E o amigo também. Só a amizade comigo mesmo e com alguns poucos familiares permanece. E com quem amo, eu acho.
Por isso prefiro falar com vocês. Quer dizer, eu escrevo e vocês me leem — quando leem. Mesmo sem resposta, sigo satisfeito. Porque, na teoria da comunicação, basta haver uma mensagem e um receptor.
E assim, eu me sinto realizado.
Obrigado às todos os envolvidos — 15 pessoas. Às vezes mais, às vezes menos. Não necessito de mais nada neste mundo. Mas um milhão de Euros cairia bem também.