Uma série de coincidências incríveis me faz até acreditar que O Homem Duplicado, de Saramago, realmente existe. Talvez a ânsia do meu amor em reencontrar alguém do passado — alguém que já não existe mais — tenha me feito confundir a pessoa que amo com outra usuária do Recanto, numa verdadeira comédia de erros.
Esse fato curioso, trágico, inocente e fatal me fez tomar consciência do ardil da minha mente, que quer enxergar em tudo e todos aquela que amei. Ou que pensei amar. Uma pessoa que talvez só existisse dentro de mim — e que agora, tudo indica, sequer quer saber da minha existência.
Isso revela, talvez, uma ausência de gosto da parte dela — ou apenas a confirmação de que eu me enganei redondamente. Que a pessoa que eu amei nunca existiu. E que eu nunca fui amado como acreditei.
A esperança falsa de reencontrar alguém do passado, alguém que já se foi — ou nunca foi — me corroeu por dentro. E, como nas minhas tentativas de reaproximação, sempre fui rechaçado de maneira indiscutível, só me restava a dúvida: como uma amizade equilibrada, harmoniosa e respeitável se transformou num caso de polícia e advogados?
A pessoa queria distância. Isso, pra mim, é incompreensível. Ser preterido, ainda mais pela categoria de médicos, sempre será incompreensível.
Mas hoje eu aprendi. E sigo adiante, fazendo o que sei fazer de melhor: criando, evoluindo, me aprimorando.
Trabalhando, dia após dia, nesse projeto interminável: a criação de mim mesmo como obra de arte.
Por ora, estou triste e constrangido, mas cheio de certezas sobre o futuro — que, infelizmente, já não prevê reconciliação nem uma vida ao lado de quem amo.