Alguém da minha estirpe — elegância, conteúdo e porte físico — não pode ser realmente feliz com alguém da área da saúde. Eu preciso de alguém da área artística. Uma bailarina como a Débora de Era uma vez na America, ou a bailarina de Fale com Ela, antes do atropelamento, óbvio — ou após a recuperação, tanto faz.
Não precisaria ser uma Gisele Bündchen, nem uma Scarlett Johansson, mas teria que ser modelo ou atriz. Eu, que sou um quase diretor — sem nunca ter escrito ou filmado um filme. Pode até ser uma atriz fracassada ou uma modelo sem trabalho, contanto que seja bela. Como em Cidade dos Sonhos, de David Lynch. Contanto que não use drogas, não fume e não beba.
Desde que tatuei a película cinematográfica no braço, só um rapaz que sentou do meu lado notou. “Nossa, que legal. É uma película cinematográfica”, ele disse. Era estudante da USP, da ECA — só podia ser.
Ele perguntou se eu filmava. Eu disse que não. Só disse que ia muito ao cinema. Ele perguntou quanto. Eu disse: “até três vezes num dia”. Na época, estava em cartaz Relatos Selvagens, que eu tinha acabado de ver. Ele perguntou se era bom. Eu disse que sim, com Ricardo Darín. Ele perguntou se era melhor que O Segredo dos Seus Olhos. Eu disse que… aí também não.
E nos despedimos.
Às vezes sinto saudade de conversar com interlocutores inteligentes e aleatórios. Engraçado que todas as pessoas interessantes que encontrei, encontrei ali: na Paulista ou na Augusta.
Sinto saudade de conversar com as atendentes cinéfilas do Cine Belas Artes, do Cine Sesc, ou do Starbucks ali próximo. E eu já fiquei com cada uma delas — e sem entorpecente. No máximo, tequila e café.
Essa reflexão sobre companheirismo passa também pela minha desistência de voltar a ficar com uma pessoa do passado. E por uma conversa com uma amiga, que disse que queria dar uma chance a outro pretendente, porque não via muita chance com o atual — um cara na metade da vida balzaquiana, que pede dinheiro emprestado e não tem nem para um sorvete.
Enquanto isso, o novo pretendente está bem encaminhado, direcionado, no último ano de um curso tradicional e bem remunerado.
Então eu disse que nem sempre um bom partido é alguém interessante. E a minha pergunta a ela foi: “ele é interessante?”
Mas se nem o atual nem o pretendente são interessantes, e um nem sequer é um bom partido, aí eu acho que é melhor ficar sozinha mesmo.
O pior cenário, eu acho, é se ver casado com alguém que seja um bom partido, com uma vida confortável — mas banal. E, portanto, miserável. Das vidas mais terríveis.
Alguém comum, que não sabe falar sobre nada. Que não sabe despertar fortes emoções. Sem elegância, sem bom gosto. Inculto. E, às vezes, com um corpo amorfo. Ou seja: a única coisa que pode oferecer é conforto e banalidade.
Nesse caso, se eu fosse mulher — ou no meu próprio caso —, eu prefiro ficar sozinho.
Eu procuro alguém interessante. Uma boa companhia. E não abro mão de que minha companheira seja, ao mesmo tempo, minha melhor amiga.
Não encontrei isso na área da saúde. Então volto meus olhos para a área mais próxima de mim: a artística. Mesmo não sendo artista propriamente, eu vivo a vida como um.