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DAVE LE DAVE
SIM, ELE MESMO
Textos

RESPEITE seus PAIS, mas não seja IGUAL a ELES.

 

 

Ouça, mas não imite

Ouça. Respeite seus pais, mas não seja igual a eles.

 

Certamente, nossos pais querem o melhor para nós, mas não podemos esquecer que eles próprios são vontade de potência — e essa é sempre uma energia que quer se expandir. O gene, mesmo inconsciente, é egoísta. Portanto, eles veem os filhos como reflexos de si mesmos, instrumentos para prosperar, fazer crescer seu império e perpetuar sua espécie. Os filhos são extensões de suas próprias vontades.

 

Mesmo quando nos amam e desejam nosso sucesso, esse sucesso ainda assim reflete o deles. Eles sentem prazer ao ver os filhos alcançando algo, porque, por meio da relação de poder, pretendem nos influenciar para que, em nós, eles se enxerguem. Querem prosperar através de nossa existência.

 

A interrogação da identidade

Em determinado momento, os pais são interpelados por alguém que os questiona sobre os filhos. E quanto mais orgulho eles sentirem ao responder para a sociedade, maior será sua vontade de potência e seu ego.

 

Isso também vale para os indivíduos. Como aponta Deleuze em Anti-Édipo, ao falar do caso Molloy:

 

“Pois o esquizofrênico é certamente interpelado, nunca deixa de sê-lo. Precisamente porque sua relação com a natureza não é um polo específico, ele é interpelado nos termos do código social vigente: qual é seu nome, quem é seu pai, quem é sua mãe?

Durante os seus exercícios de produção desejante, Molloy é interpelado por um policial:

— Você se chama Molloy, diz o comissário.

— Sim, eu disse, me lembro agora.

— E sua mamãe? diz o comissário.

— Eu não atinava.

— Ela também se chama Molloy? diz o comissário.

— Ela se chama Molloy? digo eu.

— Sim, diz o comissário.

— Reflito.

— Você se chama Molloy, diz o comissário.

— Sim, digo.

— E sua mãe, diz o comissário, também se chama Molloy?

— Reflito.”

 

A solidão e o capital simbólico

É muito difícil bancar uma vida vivendo na solidão, porque em algum momento, no mercado ou na vida social, seremos indagados: “Quem é você? Qual seu trabalho? Qual sua família? Qual sua identidade?”

 

E uma resposta sem capital simbólico, sem referências, pode nos fazer duvidar de nossa confiança e potência. Ninguém quer ser conhecido como inútil ou vagabundo que nada faz ou nada conhece.

 

Por outro lado, pega bem ser conhecido como alguém com alto capital financeiro, cultural ou simbólico — como detentor de honras e títulos.

 

É por isso que até mesmo um vagabundo, como o “sir mitômano”, desenhou em sua mente ardilosa a ficção de que é um sir honorário. Porque, ao ser indagado, pegaria mal ser reconhecido como um vagabundo inculto. Criou, então, o ardil de falsificar certificados e afirmar que tem cursos reconhecidos, apesar de sua ignorância.

 

Energia e singularidade

Quando tomamos consciência de que somos apenas um fluxo de energia, e que o estado do corpo reflete essa energia e nossos pensamentos, tudo muda.

 

Passamos a evitar relações com o mundo que drenam nossa energia. Evitamos encontros desfavoráveis à nossa singularidade, pois o corpo e o estado de ânimo são consequências diretas do nosso estado energético.

 

Por isso, evito pessoas que só reclamam, rebaixam ou são infelizes com a vida. Sua energia — e a constante reclamação — não são nocivas apenas para elas, mas para todos ao redor.

 

Aprendi a sair do local e deixar a pessoa reclamando sozinha. Aprendi a respeitar minha individualidade. Finjo que não ouço nem as reclamações da minha mãe, nem as da sociedade, porque por mais bem-intencionados que possam ser, tudo isso ainda reflete a vontade de potência de outros — não a nossa. E a melhor decisão é aquela que percorremos com as nossas próprias pernas. Então, saio do local e deixo a pessoa falando sozinha. Volto para a minha solidão, que é o caminho de volta para mim mesmo.

 

Pais ressentidos

Nossos pais são humanos, demasiadamente humanos. E por mais que queiram nosso bem, não estão ausentes de ressentimentos, ciúmes e invejas. Alguns querem controlar nossas vidas para que sejamos reflexos deles — não de nós mesmos.

 

O segredo da felicidade não é viver aprisionado ao jugo alheio, mas conquistar a liberdade. A vocação do ser humano é ser livre. É por isso que dinheiro e trabalho importam: para sermos livres, autônomos, para não dependermos financeiramente de ninguém. Quanto mais dinheiro possuímos, mais livres somos de instituições que sequestram nosso tempo.

 

O jogo da liberdade

Como a liberdade é o bem maior, nunca almejei um cargo público ou mesmo um emprego privado bem remunerado. Isso me prenderia ao cargo, à função, à empresa. Meu objetivo é voltar a ser empreendedor — e dar a mim mesmo a liberdade.

 

Veja o caso de mulheres que sofrem agressões de seus parceiros e, mesmo assim, continuam com eles. Isso acontece porque não são independentes financeiramente. Não têm emprego. Dependem deles. Mas, à medida que se emancipam financeiramente, se veem livres de amarras sociais e dos comportamentos tóxicos de seus parceiros.

 

Nietzsche, o leão e a criança

Esses são os pilares de uma vida feliz: o cultivo de si na solidão, para preservar sua vontade de potência — a fase do camelo, como diz Nietzsche. Mas, como mesmo na solidão somos interpelados, devemos ter a força do leão para darmos a nós a liberdade, através da emancipação das instituições e da família.

 

E por fim, a leveza esquecida da criança: a ingenuidade para quem tudo é novo, a capacidade de criar novos valores — seus, não dos outros. Criar uma obra externa e interna que inspire, não pela cópia, mas pelo exemplo.

 

Tudo isso passa pelo cuidado com o corpo, pela nossa fisiologia, e pelo conhecimento da nossa relação de energia com o mundo externo.

 

Um RPG chamado vida

Sempre gostei — e fui viciado — em jogos em que você evolui seu personagem. Cria alguém do zero e o desenvolve com trabalho. Como no modo carreira de jogador e treinador em jogos de futebol, ou em Madden, NBA 2K, UFC. Meu modo favorito é o de evolução. É por isso que meu gênero favorito é o RPG: normalmente você começa no nível 1 e pode alcançar até o 99 — alguns até mais. Um bom jogo deve ter essa habilidade de progressão.

 

E por que não gamificar a vida? Trazer o próprio vício dos jogos para o cultivo de si — extrair prazer em ver sua evolução refletida no corpo?

 

Quanto mais eu treino, mais sou capaz de treinar. Quanto mais eu penso, mais sou capaz de pensar. E o mesmo vale para a escrita, leitura, hábitos, rotina e consistência. Isso leva à maestria.

 

Observar nossa própria evolução é recompensador. Mas, para isso, devemos seguir nosso próprio caminho. Nosso próprio RPG. Não o jogo e os sonhos dos outros.

 

Gratidão, estudo e autenticidade

É claro: muitos de nós só somos o que somos por causa dos nossos pais, da educação e do capital cultural que herdamos. Eu só consigo treinar e estudar porque minha mãe me ajuda nas tarefas do dia a dia, para que eu possa focar no cuidado de mim mesmo.

 

Por isso treino de segunda a segunda. Leio diariamente. Escrevo sempre que posso.

 

Sou grande crítico de quem sabe apenas um assunto, ou é bom numa coisa só e ignora todas as outras. Erudição, cuidado com o corpo, capacidade de pensar — tudo isso deve caminhar junto. Com boa vontade. Porque pode haver gente mais interessante, mais forte, mais bonita do que eu. Mas com mais força de vontade, não. E é assim que pretendo inspirar: não pela cópia, mas pelo exemplo de uma vida autêntica.

 

Que digam: “Se até ele conseguiu, eu também posso.”

 

Como dizem sobre Jean Cocteau:

“Não sabendo que era impossível, ele foi lá e fez.”

 

DAVE LE DAVE II (Sim Ele Mesmo)
Enviado por DAVE LE DAVE II (Sim Ele Mesmo) em 05/04/2025
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