A história se repete comigo, como num eterno retorno, aqui no Recanto: eu comento sobre a pessoa genuinamente, ela tem curiosidade em saber mais sobre o autor espirituoso desses comentários singulares diante da enxurrada de banalidades, conhece minha página e acaba, de alguma forma, confundindo meus escritos com o autor e nutrindo sentimentos por mim. Eu mesmo sou banal — um negro de bigode, embora esbelto, é verdade, elegante, distinto, culto e educado, mas ainda banal. Mas meus escritos, esses sim, são fodas, potentes, singulares.
E, ao comentar sobre uma autora de minha predileção ou deixar um comentário, eu não me resigno a apenas bajular, mas sou sincero, incentivo, faço uma contribuição real com o que li e expresso minha opinião a respeito. E, ao comentar, estou fazendo literatura também, e gosto de me ler, inclusive os comentários que deixo. Por isso, alguém que deixa comentários iguais, como quem troca “likes”, tipo “me segue que eu te sigo”, essa mediocridade, eu quero distância.
Se tenho uma qualidade, é o bom gosto — bom gosto para música, moda, filme, literatura. Esse é meu grande talento e distinção intelectual, e eu sei julgar quando estou diante de algo belo ou um arremedo. É fato, é tino, é instinto.
E dentro desse meu gosto apurado, tenho aversão ao senso comum, que é oposto da filosofia. Valores que todos pregam como universais e bons, como compaixão, paz, amor, ternura… É fácil amar seu país quando está longe, morando no estrangeiro, amar o outro quando ele está distante. Ora, o amor e os valores não se anunciam, se praticam. Não acredito na ternura que se faz anunciar por alto-falante.
Não existe ação desinteressada. Madre Teresa de Calcutá, ao ser uma pessoa boa, virou santa!
Mas, voltando ao amor, é sempre igual: as usuárias se exibem mais através de fotos, são mais assíduas na publicação de textos.
(Inclusive, Double “N”, eu lembro do nosso começo, amor. Você trocando as fotos de perfil constantemente, postando fotos suas, em Reals, sozinha, no seu quarto da pensão. Você estava linda, contrastando com a desorganização do quarto, que me fazia lembrar até de mim mesmo. Parecia a Isabela Drummond naquela foto, só que mais bela e mais gostosa — ao meu gosto pessoal —, ainda que a foto fosse pudica. Mas a beleza e a ternura também me despertam desejo e tesão. O amor guarda essas lembranças e imagens no coração.)
Elas se sentem mais criativas e algumas me retribuem o fato falando que sou tóxico, em um misto de ressentimento, ciúmes e inveja, revelando o que há de mais comezinho. Então, dissimulam indiferença, mas continuam me espionando sem interagir, pois, afinal, sabem reconhecer o valor das coisas.
E o cúmulo é aceitar comentários-spam em detrimento de comentários elaborados — de alguém que fez literatura comentando, que separou seu tempo para deixar algo original que contribuísse com o texto, pegando citações de livros inteiros, com essa preocupação — para dar primazia a comentários sem força, belas palavras vazias. Talvez, afinal, seja questão de gosto — ou mau gosto.
Mas o pior de tudo é a ingratidão, que é um defeito de caráter. Saber do tempo que dedicamos a escrever e até divulgá-los, para no fim sermos preteridos em favor dos “likes”.
Quem comenta em troca de likes deixa só um “parabéns” no comentário, mas nos seus textos escreve bastante, é um enganador, quer chamar atenção pela quantidade, não pela qualidade.
O fato que me faz preferir a pessoa que amo, apesar dos pesares, é que ela sempre soube ver o melhor em mim, reconhecendo a essência doce, terna, carinhosa e boa.
Eu prego uma filosofia da diferença, da força da singularidade, não de valores morais que são tidos como inquestionáveis pelo rebanho, como paz, compaixão, amor ao próximo.
Ora, eu trabalho no SUS. Não quero escrever sobre o modo como ajudo pessoas com câncer, como conduzo pessoas psiquiátricas na mão, direcionando-as para além do meu trabalho, para que passem no pronto atendimento. Estudo os pacientes como se fossem parentes. Eu não anuncio caridade em alto-falante, porque a compaixão e o amor não se exaltam, se praticam!
Não quero fazer textos bonitinhos sobre paz, amor ao próximo, compaixão — coisas místicas que fogem da realidade enquanto a pessoa está distante dos problemas sociais. Não, eu escrevo e vivo os problemas. Falo da tragédia das drogas, do prazer do sexo, da fuga pela cultura e arte, da importância dos momentos de futilidade. Eu não sou hipócrita. Prego uma coisa e vivo outra, revestindo boas ações em boas palavras como se elas por si só fossem capazes de gerar altruísmo. Não, eu sou real, demasiadamente humano, e quem é real sabe quem é de mentira!
E eu tenho uma característica que vai estarrecer: nessa minha sinceridade, é que eu realmente me interesso pelas pessoas que admiro. Stendhal diz que esse é o primeiro passo para o amor. Mas, assim que surge a admiração, meu instinto é querer não amar, mas transar com essa pessoa, conhecê-la mais intimamente, por dentro e por fora. Poderia traduzir no aforismo, parafraseando Descartes: “Admiro, logo quero comer.”
E é por essa minha sinceridade que me criticam, enquanto todos vivem na sujeira, e eu sou transparente!
Vocês vivem por esses valores de compaixão, paz, tranquilidade, e eu vivo, sem hipocrisia, pelo sexo, beleza, futilidade e prazer, sem problemas!
A palavra ornamentada de beleza, mas sem significado e potência, será sempre vazia, assim como as mãos de quem a escreveu.
Sabe de gente que não é quente nem frio, é morna. E para esses Deus tem um destino reservado: Em Apocalipse 3:16, Jesus diz: “Assim, porque és morno, e não és frio nem quente, vomitar-te-ei da minha boca.”