A cultura e a intelectualidade são muito valorizadas, mas poucos estão dispostos a fazer o necessário para adquiri-las. No entanto, todos querem ostentá-las. Quanto mais ignorante é uma pessoa, mais inteligente ela quer parecer. Por isso, adere à “cosmética do saber”: um visual de intelectual que inclui, por exemplo, um Ray-Ban com armação de tartaruga, conferindo ao rosto um ar intelectualizado, enquanto oculta o olhar opaco da ignorância por trás das lentes.
A minha relação com a arte e a cultura é muito diferente. Não busco ostentá-las, nem utilizá-las por vaidade, para adquirir status ou ser reconhecido como culto. A minha relação com o saber é movida por eros, aquele desejo descrito por Platão, que nasce de uma falta — e, nesse caso, a falta é o conhecimento. Mas não é um conhecimento voltado para o simples acúmulo de informações. Para mim, o conhecimento é sobre como organizar essas informações de forma original e prática para a vida. Em outras palavras, o objetivo é a sabedoria.
Além disso, a minha relação com a linguagem, com as palavras, é muito especial. Os elogios que distribuo, as coisas que digo, não são irrelevantes. Ainda assim, sinto que as palavras estão perdendo sua importância nos dias de hoje. O carteiro está perdendo sua função porque não se escrevem mais cartas e, amanhã, o que restará? Reles coisas no chão. Uma carta de amor ou um gracejo já não são vistos como algo lisonjeador ou distinto. Os poetas e sonhadores já não têm mais espaço na sociedade moderna.
O flerte, o sinal de amor, não se traduz mais em sentimentos ou afetos expressos por palavras e linguagem, mas sim pela troca de bens materiais: o valor do presente, o preço da passagem, o tamanho da pedra preciosa do anel.
No filme de Godard, Adeus à Linguagem, o último que vi no cinema, há uma visão poética e fragmentada — característica dos trabalhos finais do autor. A obra retrata um casal com dificuldades de comunicação, e é o cachorro quem intercede na relação, assumindo a função de falar, de se comunicar por eles. Uma metáfora pungente da falta de comunicação que impera entre os casais atualmente.
E é nesse contexto que alguém como eu — uma pessoa ligada à linguagem, às palavras — acaba sendo desvalorizado. Sou preterido em benefício de um “bom partido”, o que apenas evidencia a visão de mundo de quem faz essa escolha.