No mundo atual, é fácil ter acesso à informação. Ela está disponível para todos. Praticamente todos têm um smartphone à mão para se informar. No entanto, muitos, por falta de educação formal, não têm a capacidade de distinguir entre informação de qualidade e informações ruins, separar o joio do trigo. Hoje, as fake news proliferam. Por isso, é fundamental, mais do que nunca, saber lidar com as informações: realizar uma espécie de curadoria para distinguir o que tem relevância do que deve ser descartado. Muitas pessoas não navegam na internet — naufragam. E não sabem o que fazer com tanta informação à disposição.
Com o Google, podemos tirar qualquer dúvida. Mas será que somos direcionados para sites confiáveis? Há a Wikipédia para nos ajudar a adquirir conhecimento. Mas será que seus artigos são mais consistentes do que os livros? E ainda existem ferramentas de inteligência artificial, como o ChatGPT, capazes de esclarecer dúvidas instantaneamente ou corrigir textos. Mas será que elas nunca erram? Será que, sozinhas, conseguem criar algo novo, original, que se equipare a uma obra humana?
Se essas ferramentas corrigem textos, por que ainda vemos documentos oficiais repletos de erros grosseiros? Seriam elas uma âncora para quem não sabe escrever, ou um auxílio, como um editor-chefe que revisa textos antes de serem publicados? Na minha experiência, já encontrei erros nessas tecnologias. Portanto, apesar de serem fontes de informação poderosas, essas ferramentas não criam conhecimento. Isso é prerrogativa humana e depende de como organizamos as informações disponíveis para criar discursos compreensíveis e significativos.
Sem pedantismo ou falsa modéstia, usando meu exemplo pessoal: não sou dotado de uma inteligência excepcional, mas possuo a capacidade de sintetizar informações de maneira criativa, construindo um discurso mais ou menos original. Isso me permite interpretar o mundo — e a mim mesmo — por meio desse processo. Além disso, acredito que tenho bom gosto para consumo e uma certa elegância.
Mas, diferente de informação e conhecimento, há a sabedoria. Uma pessoa pode ter muita informação e até conhecimento, mas não ser sábia. A sabedoria está relacionada a saber viver uma vida que vale a pena ser vivida, e possuir conhecimentos práticos para lidar com ela, que não são ensinados na academia ou em livros. É um conhecimento tácito ou intuitivo, como dizia Bergson.
Uma pessoa pode ser rica, mas não saber viver. Um simples camponês, por outro lado, pode ser sábio. Exemplos de figuras sábias ao longo da história são muitos. Epicteto, por exemplo, era um ex-escravo e grande expoente do estoicismo. Ele ensinava resiliência diante dos desafios da vida, concentrando nossos esforços apenas no que podemos controlar: nossas opiniões, desejos, escolhas e ações. Epicteto defendia uma vida virtuosa e em harmonia com a natureza. Suas ideias ficaram conhecidas no célebre “Manual de Epicteto”, que se tornou um símbolo de sabedoria histórica. Outro exemplo vem da Bíblia: o rei Salomão, cuja sabedoria dispensa apresentações.
Mas a sabedoria não está restrita a grandes nomes históricos. Há inúmeros exemplos de pessoas comuns, muitas delas com poucos recursos, que sabem viver uma vida feliz e oferecer conselhos valiosos. Envelhecer e se tornar maduro não é sinônimo de adquirir sabedoria. Se uma pessoa é incapaz de aprender com suas experiências, envelhecer não faz diferença nesse aspecto. Há um grande disco da banda de rock paulista Ira! que gosto muito, intitulado Vivendo e Não Aprendendo. Essa ideia também é exemplificada na peça Rei Lear, de Shakespeare, onde o bobo diz ao rei: “Pobre Rei Lear, que ficou velho, mas não ficou sábio.”
Eu, por exemplo, talvez tenha algum conhecimento, mas não posso afirmar que sou sábio. Embora, com a experiência, me sinta mais maduro e preparado para a vida. Identifico-me com o livro O Homem que Dorme, de Georges Perec, que narra a jornada existencial de um estudante que permite à apatia tomar conta de sua vida. Diante do absurdo da existência e da falta de sentido, ele se resigna, vivendo apenas para comer, dormir e esperar o tempo passar. Essa sensação é capturada visceralmente no seguinte trecho:
“Você não sabe viver e nunca saberá. É simples assim. Você não nasceu para isso, e não adianta insistir. Não há qualquer virtude em aprender a ser o que você não é. Não há qualquer glória em enganar-se. Você viverá a sua vida como um sonâmbulo, como uma sombra, como um ruído tênue e longo.”
Esse é o retrato de alguém com conhecimento, mas sem sabedoria prática para lidar com a vida. Quando estava na minha adicção ativa, eu me via assim. A dependência roubava meu tempo e me afastava das coisas que eu amava. Hoje, vejo aquele passado recente como uma sombra, algo distante, mas que ainda me persegue e assombra.
Agora, abstêmio, mesmo sem levar uma vida exemplar, voltei a fazer coisas que gosto. Estou assistindo aos jogos de futebol que havia interrompido, acompanhando os playoffs de futebol americano e, embora ainda não esteja lendo ou vendo tantos filmes quanto gostaria, tenho escrito bastante e tido novas ideias. Sinto mais disposição, otimismo e energia. Meu corpo está mais presente, não mais flutuando em um lugar qualquer.
Parte da sabedoria é aprender com o passado e com as experiências para não repetir erros no futuro, vivendo um presente mais pleno. Mas não podemos ressentir o passado ou nos prender a uma nostalgia que nos paralise. O passado deve ser fluido como um rio. E, nesse contexto, devemos aproveitar a era da tecnologia para transformar informação em conhecimento e buscar viver uma vida com mais sabedoria.